Maria D’Guia era a caçula de 14 irmãos de uma família nordestina, que veio pra Brasília tentar uma vida mais fácil. Mas, tinham uma vida bem difícil. Às vezes, faltava o que comer e a pobre menina que nessa época tinha nove anos, ia pra escola com o bucho vazio, e por vezes o ouvíamos roncando, reclamando comida. Nessa hora juntávamos moedas daqui e dali por toda a turma da escola pra comprar o lanche pra ela.
A menina tinha uma imaginação muito fértil e contava casos mirabolantes, de discos voadores, fantasma que sujava o uniforme dela(sempre estava sujo), duendes que apagavam os deveres e por aí. E por causa dessa “imaginação” mais do que fértil ela apanhava todo dia. A mãe, era chamada sempre para comparecer à escola porque ela não fazia os deveres, ou se fazia, os duendes apagavam. A mãe, nordestina arretada, dizia: “ Professora, pois te dou direito de espancar essa mentirosa, castigue essa bichinha, que ela não é fácil. D’Guia ficava com os olhos arregalados de medo... Mas, mentir era algo que já fazia parte do cotidiano dela.
Um dia chegou à escola parecendo uma berinjela de tanto que apanhou por mentir, e nesse dia tomou a decisão de nunca mais falar uma mentira na vida.
O pai trabalhava em construção como pedreiro, e não ganhava o suficiente pra alimentar tantas bocas. Todavia, podia faltar tudo, menos a garrafa de cachaça que nos fins de semana era motivo de confraternização entre os amigos de pinga. E para tira-gosto nada como pés de galinha bem cozidos até formar um caldo grosso. Era uma festança só!
Num desses dias de festança, faltou o dinheiro pro tira-gosto corriqueiro e ficaram imaginando o que fazer para acompanhar a pinga. De repente, a resposta veio do céu: Os pombos do vizinho! Fizeram pombos à passarinho, e a festa rolou o dia todo.
O vizinho esperou que os pombos voltassem pra casa na boquinha da noite, como era costume. Como não apareceram, ele saiu procurando suas aves de estimação de porta em porta, até que chegou à casa do pai da D’Guia e perguntou:
- Por acaso os senhor viu meus pombos? Só voltaram quatro e seis não retornaram para o pombal.
- Não vi não. Hoje não vi nenhum, achei até que estavam presos. Mas, procure que vai achar...
D”águia ouviu todo o diálogo. E quando o vizinho agradeceu e estava no portão, ela saiu pela lateral da casa e chamou:
- O senhor ta procurando seus pombinhos né?
- Sim estou. Mas, ninguém sabe deles.
- Eu sei... Olha aqui os pezinhos dos seus pombinhos - ela tinha colocado todos os pés num saco e abriu pra ele ver – Eles comeram seus pombinhos com pinga. Esconderam as penas e os pés dentro de um saco pra jogar bem longe amanhã, mas eu trouxe os pezinhos pra você acreditar que eles morreram...
Nesse dia quase que D’Guia ficou órfã. O vizinho enfiou um revólver na boca do pai dela e disse que ia fazê-lo engolir a arma, tal qual engoliu seus pombos. Depois de muito deixa disso, pare com isso, pense bem, o vizinho relevou e foi embora. E nesse dia a pobre menina apanhou como nunca tinha apanhado na vida.
Pobre menina pobre! Lamuriosa repetia sem parar: “ Eu não entendo o que querem comigo, pois se minto, apanho e se digo a verdade, apanho também! Assim fico confusa..."
Acho que o problema é que ela disse a verdade numa "hora errada!" E ainda dizem que a verdade cabe em todo lugar! Tsi...Tsi...Tsi...
Acho que o problema é que ela disse a verdade numa "hora errada!" E ainda dizem que a verdade cabe em todo lugar! Tsi...Tsi...Tsi...
Marly Bastos